XXI


Tal como Jonas, esse Profeta

que, quando ouviu a voz do Senhor,

aterrado, fugiu  e acabou

dentro de uma baleia,

se alguma vez tu, Deus,

tivesses falado comigo

e nesse momento a tua voz

se ouvisse com toda a clareza,

nesse momento é possível

que tivesse enlouquecido

de uma forma muito grave,

pelo menos durante alguns dias.

No meu caso, porém,

se Deus me falasse

uma segunda e terceira vez,

o mais certo seria

perder para sempre o juízo,

mas Jonas ficou dentro do peixe

como se estivesse num sepulcro,

mergulhado na escuridão,

com algas enroladas na cabeça,

durante três dias e três noites,

angustiado e a rezar.

Por isso, a história diz

que Deus fez com que o peixe

fosse vomitar Jonas

em terreno bem firme

e que tornou a falar-lhe,

dizendo: «Anda!»

E dessa vez Jonas

ouviu e obedeceu,

partindo a pé para anunciar

a destruição de Nínive.

Porém os habitantes da cidade,

quando ouviram a mensagem de Jonas,

os habitantes de Nínive

arrependeram-se tanto,

que Deus decidiu não os castigar

como antes tinha pensado,

e Jonas partiu para o deserto

à espera de morrer,

revoltado contra um Deus

que mudava de ideias

conforme

os sentimentos dos homens.

Deus então

fez crescer uma planta

ao lado de Jonas,

para lhe dar sombra

e confortar no seu desgosto,

mas Jonas, porém,

não percebeu

o que Deus lhe queria dizer

e por isso, na manhã seguinte,

Deus fez com que um bicho

fosse roer a planta

e então ela secou.

Jonas dizia, muito zangado:

«É melhor para mim morrer

do que viver assim!...»

Mas Deus respondeu a Jonas:

«Achas que tens razão

para te irritares assim

por causa de uma simples planta?...»

Mesmo uma planta

não sendo uma cidade,

Jonas respondeu:

«Acho que tenho razão

e estou profundamente irritado.»

Por isso, Deus pôde explicar-lhe,

que se Jonas tinha compaixão

pela vida de uma simples planta,

mais compaixão teria Deus

pelos milhares de vidas da cidade.

Jonas teve assim

oportunidade de compreender

aquilo que o seu espírito

de outra forma

não alcançaria.

No entanto,

por causa desta história,

e porque nem todos

temos o espírito e a força

de um profeta,

penso muitas vezes

que é preferível que Deus

de forma alguma nos fale,

ou então pareça apenas

que nos fale indirectamente,

através de acontecimentos e sinais

e sem nenhum tipo de explicação.