Houve quem perguntasse porquê,
tendo sido nós
dotados desta aspiração a uma coisa
maior,
desta fome de Deus, deste querer
saber mais
do que a razão permite, tendo sido
nós
ocupados por esta indagação do sentido
do que possa ser realmente bom, nas
nossas vidas,
então porque é que a natureza nos
privou
dessa inteira lucidez que seria a
visão
de todos esses mundos, e da justiça
e da bondade
deste deus a que o coração aspira,
mas não alcança.
O mesmo homem tão verdadeiro, tão
lúcido,
tão determinado e compassivo, que
tal pergunta
enunciou, teve também a coragem de
propor uma resposta,
perguntando, então, se
continuássemos a ser humanos,
e com uma tal sabedoria, tal, que
nem podemos
sequer imaginá-la, então, o que
seríamos?
Seríamos de tal forma absolutamente
obedientes,
desde o início das nossas vidas,
mas não por esperança,
não por dever, não por experiência,
não por rendição,
não por amor ao Deus da nossa mais
íntima inspiração,
contudo, desconhecido, e aí então
seríamos como fantoches,
meros mecanismos de um teatro em
que todos nós
gesticularíamos tão perfeitamente
bem, mas sem
que vida alguma, nessas perfeitas
figuras,
fosse possível vislumbrar. Onde
estaria então
esse outro dom, este intocável do
inesperado
com que somos lançados neste
mundo?...
Por tudo isto, e porque também não
é provável que possa
realmente apertar-lhe as mãos nesse
mundo dos mortos,
quero deixar aqui estas palavras,
aqui,
neste mundo de vivos, como que
gravadas
em lápide, porque enquanto as
conservar, vivas,
dentro de mim e do meu coração, sei
que é
absolutamente impossível que alguma
vez volte
a sentir-me assim tão só, tal foi a
companhia e a alegria
que senti, quando li que «deste
modo, portanto,
também poderá ser exacto o que nos ensina
suficientemente o estudo da
natureza e do homem,
isto é: que a sabedoria
impenetrável,
por meio da qual existimos, não é
menos digna
de veneração por aquilo que nos
negou,
do que por aquilo que nos
concedeu.»